Tempo cria e destrói os mitos do ofício da reparação automotiva

 Tempo cria e destrói os mitos do ofício da reparação automotiva

Profissão respeitada, essencial para o mundo moderno, e que movimenta muito dinheiro não está livre de preconceitos e crenças populares

Muitos menosprezam a importância dos reparadores no Brasil, mas é sabido que ninguém vive sem eles. O relatório anual do Sindirepa mostra que, só em 2019, o setor faturou R$ 67,7 bilhões, dos quais 70% vem das peças de reposição e 30% da manutenção e reparação.

O relatório também revela o total de empresas dedicadas à finalidade de manutenção e reparo de automóveis: 69.381, em 2019, com 18.656 só em São Paulo.  Os dados mostram também o número de profissionais qualificados, que cresce cada vez mais, para exercer o ofício da reparação automotiva. Em 2010, o número de reparadores com formação inicial e continuada, oferecida em instituições como Senac, era 76. Em 2019, o número saltou para 858.038.

Apesar do crescente número de interessados pela área e de reparadores se formando, a ocupação ainda é mal vista por alguns. Luiz Antônio Cunha, professor titular da UFRJ, explica no artigo “O ensino industrial-manufatureiro no Brasil” que, esse preconceito, resquício do período colonial, vem do fato de que, na época, os trabalhos manuais  como carpintaria e alvenaria eram exercidos por escravos. E por isso os homens livres se afastavam o máximo destes ofícios.

Segundo Cunha, foi a rejeição do trabalho insignificante que levou ao preconceito contra o trabalho manual, trabalho este que não era desprezado, e sim quem o praticava. Não fosse esse o caso, o ofício não seria objeto de rejeição.

A profissão tem suas crenças populares e folclore criados pelos profissionais, consumidores ou pelos antigos costumes. Uma delas, por exemplo, diz que é bom misturar gasolina com álcool em veículos flex para o combustível render mais.

Como em toda atividade já consolidada, o meio da reparação e manutenção de veículos também possui suas crendices. A maioria delas estão relacionadas ao funcionamento do carro e grande parte das pessoas ainda acredita nelas. Confira cinco crenças comuns:

Nas descidas o ponto morto economiza combustível

Esta prática era necessária e verdadeira quando os veículos tinham carburador. Hoje, a injeção eletrônica é cortada quando o veículo está descendo engatado, já que o movimento das rodas faz com que o motor gire. Atualmente, o câmbio desengatado é que faz com que o motor ative a injeção de combustível, então acontece o contrário: o mais econômico é descer engatado e não na banguela.  Sem falar que essa prática é muito mais segura, porque o freio motor se mantém.

O motor deve ser aquecido em dias frios e antes de rodar

Esta crença nasce e morre pelo mesmo motivo: o carburador. Quando os carros ainda tinham essa peça, a lubrificação do sistema e a mistura de ar com combustível era feita de forma mais rudimentar. Atualmente, a injeção eletrônica faz essa mistura com muito mais eficiência. Aquecer o motor antes de rodar para melhor funcionamento também não é necessário. Hoje, os motores chegam à temperatura de trabalho mais rápido, então, se você quiser fazer isso e não se importar com os gases na garagem, saiba que dois minutos é o suficiente.

É preciso amaciar o motor de um carro novo

Mito e verdade, essa prática atualmente gera muita discussão e dúvida, principalmente em relação a velocidade máxima e estradas. No que diz respeito a velocidade máxima, não há restrições, exceto a indicação para não superar os 100 km/h nos 5 mil primeiros quilômetros. O que não significa que é para pesar o pé no seu 0 km.

Quanto ao tráfego em rodovias, o esperado é que se atinja velocidades mais elevadas nelas, certo? Cada montadora dá, no manual do carro, instruções de como proceder na situação de estrada, mas elas entram em consenso quanto a não ser recomendável manter altas velocidades constantes por longos períodos nos primeiros quilômetros.

Passar na lobada na diagonal é melhor

Esta prática surge das lombadas que ultrapassam o tamanho previsto pela Contran e pelas pessoas que não têm o carro na altura original. Passar incorretamente na lombada pode danificar o cárter do motor e trincá-lo , o que ocasiona um vazamento de óleo. O carro que passa em todas as lombadas na diagonal gera um trabalho que tende a torcer sua estrutura. É comum também danos na suspensão e perda de alinhamento.

Quando for trocar os pneus, substitua todos ou os da frente

Se eles forem do mesmo tamanho, modelo e marca não importa quando são trocados, lembre-se apenas de fazer o rodízio dos pneus para aumentar a vida útil deles. Quanto a escolha de trocar só os pneus dianteiros: tome cuidado. Muitos acreditam nisso porque são eles que controlam a direção do carro, mas são os pneus traseiros que dão estabilidade para o carro e são indispensáveis para momentos como aquaplanagem e frenagens bruscas.

A profissão do reparador é envolta em mistério e até mesmo sofre alguns preconceitos por parte da sociedade, mas isso vem mudando pelo esforço dos profissionais da área. Muitas vezes, este preconceito vem, justamente, da falta de conhecimento por parte dos clientes e leigos. Sobre isso, há uma história clássica que ainda é contada nas oficinas aos que estão começando que ilustra esta situação: 

Certa vez, um submarino nuclear parou de funcionar e todos ficaram apavorados porque não sabiam fazer a manutenção dele. Então, resolveram chamar um técnico do fabricante, que ficava no exterior. O técnico veio para o Brasil e foi ver o submarino. Olhou por um tempo até que pediu um martelinho. Deram o martelinho para ele e com apenas uma batidinha na embarcação, ela voltou a funcionar. Quando perguntaram quanto ficaria o serviço, respondeu que mil dólares cobririam o trabalho. Quando ele disse o valor, todos protestaram dizendo que era muito caro para uma simples batidinha com o martelo. Foi então que ele disse: “a batida do martelo é de graça, eu cobro somente por saber onde bater”.

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